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Estupradores, integrantes da extinta Banda New Hit são condenados a mais de 11 anos de prisão!

* Por Núcleo Negra Zeferina da Marcha Mundial das Mulheres (BA)

SÓ A LUTA MUDA A VIDA!

No dia 26 de agosto de 2012, na cidade de Ruy Barbosa na Bahia, duas adolescentes foram estupradas por 9 homens integrantes da Banda New Hit dentro do ônibus do grupo. As meninas se dirigiram ao veículo para pedir autógrafos e parabenizar um dos integrantes que fazia aniversário. Lá, foram violentadas de forma brutal e humilhante, com a conivência e também violência de um Policial Militar.

Nessa quarta-feira, 06 de maio de 2015, recebemos a notícia de que todos foram condenados. Comemoramos com muita euforia. Não somente pela condenação em si, mas pelo que ela representa: a violência contra as mulheres não ser aceita como coisa natural! Quando realizamos o primeiro escracho contra Eduardo Martins, em 18 de outubro de 2012, queríamos principalmente afirmar a necessidade da reação organizada das mulheres como fundamental para combater a violência sofrida por nós todos os dias.

Nessa conjuntura, lutar pelo fim da violência contra as mulheres é também lutar para que os agressores sejam punidos. Compreendemos que não vivemos em um país impune, e sim de punitividade seletiva, não há dúvidas, a cadeia existe para encarcerar o povo negro. Tendo inclusive, a primeira “Brigada Militar”, hoje polícia, surgido para prender a Negra Zeferina e os revoltosos do Quilombo do Urubu. O mesmo sistema carcerário que não titubeia para prender um jovem negro por ser negro, demora mais de 2 anos para condenar estupradores. Apenas 2% dos agressores de mulheres são condenados no Brasil, nos casos de violência sexual o número é ainda menor, apenas 14% das vítimas consegue denunciar tamanha brutalidade. A impunidade incentiva e naturaliza a violência contra a mulher.

O caso “New Hit” não é isolado, pelo contrário, casos como esse são cada vez mais recorrentes em nossa sociedade, que convive com a violência contra as mulheres como forma de dominação e exploração, mecanismo poderoso de controle da vida, corpo e sexualidade das mulheres. O estupro é talvez a manifestação mais cruel da violência machista, anuncia o fato de que não temos possibilidade de escolhas sobre o nosso próprio corpo, e que nossas vidas estão inscritas no limite da subordinação aos homens.

A violência sexual parte da compreensão de que o homem tem direito sobre o corpo da mulher. Um dos debates mais constantes que enfrentamos quando estamos falando sobre o crime de estupro é a culpabilização da vítima pela violência sofrida. Em diferentes culturas utiliza-se o argumento do consentimento, é comum ouvir que as mulheres violentadas consentiram ou provocaram, pediram pelo estupro. Pretendem não somente culpabilizar a vítima, tornar trivial o crime como também excitante, seja na pornografia ou na esfera legal. E é quase sempre uma “vergonha” para as vítimas e suas famílias.

Dezenas de mulheres são violentadas por dia, nós pensamos em porque escolher um caso, não estaríamos ali individualizando um problema maior? Não estaríamos deixando de fazer uma crítica sistêmica? Ao passo que começamos a refletir “Mas como devemos agir? Como podemos explicitar a necessidade de reação organizada das mulheres contra a violência?”

Não foi somente Eduardo Martins escrachado, não foi somente a Banda New Hit escrachada. Seguimos afirmando que a violência contra as mulheres não é tolerada, aceita, e não pode ser amenizada. Essa condenação ela é importante porque é também pedagógica, principalmente por ter sido acompanhada de organização e luta social. Porque as mulheres reagiram.

No momento em que estamos vivendo, de crise econômica do capital, há o expresso aumento da opressão e exploração das mulheres no mundo. As políticas de austeridade impostas pelos países impactam diretamente na vida das mulheres, uma vez que os cortes direcionam-se aos direitos do trabalho, afetando a igualdade salarial, os direitos previdenciários – como a licença maternidade, os recursos destinados para os serviços públicos, em especial, nas áreas de socialização do trabalho doméstico e dos cuidados.

Para sair da crise o capitalismo reforça seus mecanismos patriarcais de dominação e exploração, por exemplo, impondo retrocessos nas legislações de alguns países que legalizaram o aborto, destruindo territórios e violando os corpos das mulheres, que são utilizados como “moeda de troca” nas guerras geradas pelo imperialismo, como tem sido os casos do sequestro de meninas, dos estupros coletivos. Os valores da família burguesa tradicional – patriarcal, branca, heterossexual – reaparecem. Há uma “onda conservadora” como resultado da tentativa do capitalismo patriarcal e racista reorganizar seu processo de acumulação.

No Brasil temos o congresso nacional mais conservador desde 1964, no lugar que deveria ser a casa do povo, teve deputado federal ameaçando em tribuna estuprar outra deputada, o controle sobre os corpos das mulheres é pautado cotidianamente – vide estatuto do nascituro, o encarceramento em massa do povo negro é tratado como solução para os problemas de violência social, e os direitos trabalhistas sendo sistematicamente atacados como resposta aos problemas gerados pela crise econômica. A exemplo, o avanço da regulamentação da terceirização com a PL4330, agora PLC30.
O congresso nacional brasileiro é expressão da difícil correlação de forças que nos encontramos.

Para nós, feministas, mais do que nunca, é preciso ir para a ofensiva. Sem mudar o sistema político não será possível mudar a vida das mulheres. Esse congresso nacional não fará as transformações necessárias para resolver os problemas vividos pelo povo brasileiro, simplesmente porque não é de seu interesse. Eles representam os interesses da classe dominante, do capital financeiro internacional, não são os legítimos representantes do povo. Mas como fazer? Como avançar na constituição de um aparato estatal que combata de fato a violência contra as mulheres? Como avançar na socialização do trabalho doméstico e de cuidados? E terra, educação, trabalho, saúde, direitos sociais? Esses senhores, “donos do poder” não se importam com o povo.

Para nós, nesse momento, enfrentar a violência contra as mulheres é necessariamente empunhar uma bandeira política que paute a questão do poder para o povo. Nós, mulheres trabalhadoras, queremos decidir os rumos do nosso país e compreendemos que a defesa de uma constituinte exclusiva e soberana do sistema político é central para a luta feminista avançar. Esse congresso nacional não enfrentará as agruras das mulheres, ele se beneficia com a opressão e exploração sofrida por nós.

O que tudo isso tem haver com o estupro dessas duas jovens e a luta feminista construída para a condenação dos estupradores? Tudo. O que estamos afirmando é que a violência contra as mulheres é parte do que organiza a sociedade capitalista patriarcal e racista, combatê-la é necessariamente agir para alterar as bases materiais de sustentação desse modo de produção e reprodução da vida.

Se em meio a crise econômica o capital tem como saída as ações violentas: guerras, genocídio do povo negro, aumento do controle sobre os nossos corpos, fortalecimento da violência contra as mulheres, aprofundamento da divisão sexual do trabalho, é preciso construir alternativa de poder para o povo. Para isso não há outro caminho que não a organização, é preciso reagir de forma organizada, é preciso ir além de atitudes feministas.

Durante esses 2 anos e meio de luta duvidamos, por vezes, que a condenação aconteceria… nos perguntamos “o que é ainda é preciso fazer?” Mobilizamos o país, tentamos fazer (e fizemos!) a história de dor e força dessas duas jovens – que levaram à frente esse processo cruel e avassalador – chegar em dezenas de países, envolvemos artistas, autoridades, parlamentares, mobilizamos as pessoas em suas casas, locais de trabalho, pautamos os meios de comunicação de canto a canto… e nada. Se para nós foi difícil, imagina para as jovens violentadas… são duas guerreiras! Elas resistiram quando a morosidade da “justiça” ia comendo nossas esperanças e as ameaças de morte nos deixavam temerosas. Essa condenação é uma vitória delas e de todas as mulheres.

A luta pela condenação dos estupradores da New Hit reacendeu em muitas mulheres a vontade de lutar, e fez fogueira nas centelhas de muitos jovens corações. E o principal disparador não foi o escracho em si, ou a ida ao julgamento, ou a raiva com que brigamos com policiais, mas a ação. Que essa vitória ecoe aos gritos em cada corpo indignado “É preciso passar à ação!” É preciso não desistir mulheres! É preciso seguir em marcha, atentas, juntas. É preciso em meio a tantos problemas, desesperança, dores, derrotas, divergências, agonias seguir em luta. A banda New Hit foi condenada, mas a nossa luta nem de longe termina.

Nesse caminho curto do Núcleo Negra Zeferina estamos aprendendo muito, e um dos ensinamentos vindo com a luta é que sem feministas não há feminismo, sem organização não tem revolução, e sempre, “Maria, vá com as outras!”

“Assim dizendo a minha utopia eu vou levando a vida, eu vou viver bem melhor, doida pra ver nosso sonho teimoso um dia se realizar!” (Milton Nascimento com adaptações feministas)
Por um Projeto Feminista e Popular!

Seguiremos em Marcha até que todas sejamos livres!

Constituinte Já!

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