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Marcha das Margaridas começa hoje em Brasília e traz as reivindicações das mulheres rurais

Batucada feminista da Marcha Mundial das Mulheres presente na Marcha das Margaridas 2015
Batucada feminista da Marcha Mundial das Mulheres presente na Marcha das Margaridas 2015

A Marcha das Margaridas, maior manifestação de mulheres da América Latina, acontece a cada quatro anos e reúne milhares de mulheres em torno de reivindicações para construir justiça e igualdade no campo, nas águas e nas florestas. Em 2015, a expectativa é de 100 mil participantes vindas de todas as regiões do país, em caravanas organizadas pela CONTAG e o conjunto de organizações e movimentos sociais parceiros da Marcha das Margaridas, como a Marcha Mundial das Mulheres e a CUT.

Com o lema “Margaridas em marcha por desenvolvimento sustentável, justiça, soberania, liberdade e igualdade”, as mulheres apresentaram uma pauta com reivindicações de políticas públicas de fortalecimento às alternativas feministas e agroecológicas.

Pelo reconhecimento do trabalho das mulheres

Ainda hoje, muitas políticas públicas encontram limites porque seguem a cultura patriarcal, que naturaliza a divisão sexual do trabalho e considera os homens como provedores das famílias, ocultando a contribuição econômicas das mulheres para a sustentabilidade da vida.

Entre as demandas urgentes das mulheres pescadoras, inseridas no modelo de economia familiar, é ter acesso aos mesmos direitos dos trabalhadores da pesca, como o benefício do seguro defeso. O Estado considera as mulheres como apoiadoras da pesca, porque muitas não são as responsáveis pela atividade de pescar o peixe em si, mas sim por processar e beneficiar o pescado, além de fazer a manutenção dos materiais. Mesmo que o trabalho das mulheres seja fundamental para esta economia, o Decreto 8425 não reconhece as mulheres pescadoras como tal e elas não podem receber o seguro defeso na época em que não se pesca, ficando sem renda.

Outra reivindicação que está na pauta das mulheres rurais desde outras edições da Marcha das Margaridas é a reformulação da DAP (Declaração de Aptidão ao PRONAF), para ampliar sua autonomia e fortalecer seu trabalho. A DAP é um meio necessário para o acesso às políticas públicas no campo, reivindicação das mulheres para aumentar sua autonomia e fortalecer seu trabalho. A DAP hoje é uma política pública que tem como referência a família, e isso restringe as mulheres de terem acesso individual a uma série de políticas. As Margaridas propõem alterar o cadastro da DAP para uma formulação familiar que considera individualmente as pessoas integrantes da família.  Essa alteração deverá vir com o aumento dos recursos e as políticas voltadas para as mulheres rurais, e fortalecerá também as filhas mais jovens da família a impulsionar suas iniciativas e desenvolver seus trabalhos.

A aplicação em todo o Brasil do projeto “Terra, terreiro e quintal”, para as mulheres que produzem para autoconsumo e venda é uma demanda das Margaridas. A exigência é que o Estado reconheça a importância desta produção para as famílias e para as comunidades locais. Mas as mulheres querem ir além dos quintais e se organizam em grupos produtivos e cooperativas. A demanda é de mais apoio a formação e manutenção dos grupos produtivos de mulheres, e de ampliar a participação delas no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Para ampliar sua participação, é preciso vencer as barreiras colocadas por normas sanitárias que não consideram a produção artesanal e doméstica. Esta produção já está reconhecida pela ANVISA com a RDC 49, uma vitória que ainda precisamos ver concretizada na realidade das mulheres produtoras, da agricultura familiar e da economia solidária. E precisamos avancar no registro de produtos de origem animal, como os queijos e o pescado processado.

A demanda urgente é de que a regulação de polpas de frutas saia da responsabilidade do Ministério da Agricultura (MAPA) e passe para a ANVISA. Desta forma, as mulheres que aproveitam as frutas de diferentes regiões do país podem seguir vendendo seu produto para os programas governamentais de alimentação de crianças e pessoas atendidas pela rede socioassistencial. Assim, mais pessoas podem ser enriquecidas com este alimento produzido de forma saudável.

O Programa de Aquisição de Alimentos mudou para melhor a vida de muitas pessoas que produzem e que consomem alimentos de qualidade. Por isso as margaridas repudiam as tentativas de criminalizar o programa, que criam o risco de burocratizá-lo a tal ponto que podem chegar a excluir as organizações menores e as mulheres.

Estas pautas fazem parte da luta feminista para impulsionar a autonomia econômica das mulheres, aliada à colaboração mútua e solidária. A autonomia econômica é importante não apenas para fortalecer o trabalho e a independência das mulheres, como também para ajudá-las a sair de situações de violência doméstica e de abusos. A violência contra as mulheres no campo é uma realidade e ainda há muito que avançar em seu enfrentamento. As unidades móveis, ligadas às equipes técnicas dos  municípios, ainda são muito limitadas. A necessidade é de mais recursos federais e de que haja um melhor acompanhamento do repasse para que esta política seja realmente efetiva.

Pelo direito à terra, sem a presença de agrotóxicos e do agronegócio

Diante das ofensivas do agronegócio e das mineradoras sobre os territórios de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, as Margaridas reivindicam reforma agrária e demarcação das terras indígenas, quilombolas e das comunidades tradicionais! Nos preocupa o chamado pacote anti-crise apresentado ontem pelo Senado Federal, em particular no que tange a proposta de revisar a regulamentação das terras indígenas para compatibilizá-las com as atividades produtivas do capital e simplificar o licenciamento ambiental para as obras do PAC.

O impacto das grandes obras sobre as populações locais também é denunciado nesta Marcha das Margaridas, pois a chegada das grandes empresas, principalmente de mineração, são responsáveis pelo crescimento da demanda por prostituição e exploração dos corpos das mulheres, além de enfraquecer e desmantelar as economias locais. A proposta das Margaridas é criar um canal direto com o Governo Federal para encaminhar as denúnicas destes casos e impedir tamanhas violações.

Em defesa da soberania alimentar e da saúde das comunidades, as mulheres enfrentam a expansão dos agrotóxicos, disseminados pelo agronegócio. Os agrotóxicos contaminam nossos corpos, enriquecem grandes empresas transnacionais e colocam em risco a agricultura familiar e as práticas agroecológicas. Mesmo assim, o Brasil guarda o triste título de campeão no uso de agrotóxicos. As mulheres exigem a implementação do PRONARA, Programa Nacional de Redução do Uso de Agrotóxicos. O programa inclui uma série de iniciativas para para o monitoramento dos agrotóxicos, restrições de uso, como por exemplo a pulverização aérea, que contamina o meio ambiente, impede a produção orgânica e agroecológica e chega atingir escolas e comunidades.

As Margaridas trazem com força suas reivindicações e, nos dias 11 e 12 de agosto deste ano, sua mobilização é um marco para a lutas de combate ao conservadorismo e ao machismo, por um mundo mais justo, livre, igualitário e sustentável.

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