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Nota pública contra o Estatuto do Nascituro (PL 478)

1f341290-8291-4986-bcc1-0f92d6615dee-300x197Nós da Marcha Mundial das Mulheres vimos expressar nosso mais veemente repúdio à votação do Estatuto do Nascituro, também conhecido como “Estatuto do Estuprador” ou “Bolsa Estupro”. O Estatuto do Nascituro foi novamente colocado em pauta para votação na Comissão dos Direitos da Mulher da Câmara Federal, ou seja, justamente onde nossos direitos deveriam ser preservados e ampliados. A Comissão dos Direitos da Mulher subverte seu papel de defesa dos direitos, e está se prestando a um papel lastimável ao tentar retirar das mulheres, além de seus direitos, sua própria condição de cidadania e humanidade.

Essa votação ocorre nos últimos minutos de mandato da legislatura atual. É mais uma forma da extrema direita fascista se impor e manter mobilizados os setores mais retrógrados e conservadores da sociedade. Nestes anos de conservadorismo, o procedimento de aborto legal tem ficado cada vez mais inacessível. É sabido que a criminalização do aborto nao diminui a quantidade de procedimentos, apenas empurra as mulheres e meninas a abortos em condições inseguras, colocando a saúde e a vida em risco.

Graças à coragem e compromisso de algumas deputadas feministas nessa comissão e ao apoio do movimento feminista, a votação tem sido barrada. A proposta do Estatuto do Nascituro está na Câmara Federal desde 2007. Em todas as tentativas de tramitação, foi rechaçada pelos movimentos feministas e de direitos humanos e pela comunidade científica.

Se aprovado, esse projeto de lei ampliará a criminalização do abortamento para as situações que hoje são permitidas por lei, e obrigará as meninas e mulheres com gravidez resultante de estupro a manter essa gravidez. Uma gravidez compulsória nos casos de estupro pode levar a mulher ou menina a graves situações de saúde mental. Castigar uma pessoa que já sofreu um estupro a suportar uma gravidez resultante desse trauma é uma crueldade.

Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, de 2019 a 2021 o país teve 73.442 estupros de crianças e adolescentes. A maioria é de meninas na faixa etária de 10 a 14 anos. Os estupradores em geral são os pais, tios, padrastos, homens que são parentes ou de convivência próxima da criança. Além de toda a violência sofrida, a criança ainda terá interrompida a infância, os estudos, para viver a tortura de uma gravidez forçada.

O projeto de lei também impõe a ideia da vida desde a concepção, que não tem respaldo pela comunidade científica. Qualquer mulher grávida que tenha um aborto, mesmo que espontâneo, poderá ser suspeita de crime. Esse é um projeto que vai afetar principalmente a vida das mulheres e meninas pobres, negras, do campo e da floresta, com baixa escolaridade, uma vez que as mulheres com maior poder aquisitivo têm mais acesso a métodos clandestinos mais seguros e sofrem menos criminalização.

Outra questão grave é que o projeto de lei ameaça afetar o direito constitucional à contracepção, porque métodos como contraceptivo de emergência e DIU podem não ser admitidos, com a justificativa falaciosa de serem abortivos.
O projeto de lei obrigará uma remuneração às vítimas de estupro (a “bolsa estupro”) pelo estuprador. Isso abre brechas para que o estuprador tenha acesso à sua vítima, deixando a mulher ou menina em risco por toda a vida.

Enfim, o Estatuto do Nascituro define direitos para embriões e fetos em detrimento da autonomia e dos direitos de uma pessoa nascida, com projeto de vida, que passa a ser apenas um receptáculo sem qualquer direito de decisão. Os setores que dizem defender a vida desde a concepção são os mesmos que apoiaram e foram parte de uma política que matou quase 700 mil pessoas na pandemia, que permitiram que mais de mil mulheres grávidas e recém nascidos morressem na pandemia por falta de leito e cuidados específicos. São os mesmos que apoiaram cortes nas áreas da saúde, assistência e educação, e usaram parte desses recursos em seus orçamentos secretos. A extrema direita não defende a vida. O Estatuto do Nascituro é mais uma de suas estratégias para expressar o ódio contra as mulheres e fortalecer o patriarcado racista.

Marcha Mundial das Mulheres
13 de dezembro de 2022

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